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quinta-feira, 28 de junho de 2012

A interpretação

A interpretação


Por Flavia Bonfim


Para repensar o lugar da interpretação no tratamento analítico, Lacan (1998), em seu Escrito “A direção do tratamento e os princípios do seu poder” de 1958, propõe articulá-la com ele denomina “Doutrina do significante”. Doutrina, esta, que nos fala dos efeitos dos significantes sobre o advento do significado e que, portanto, nos aponta que é por meio do deslizamento dos significantes que as significações são produzidas. Ou seja, trata do princípio de que o significante não está colocado ao significado, de que somos marcados pelos significantes antes mesmo de podermos atribuir-lhe qualquer significação, mais ainda, de que a significação advém após a enunciação do último termo sentença – quer dizer, as significações surgem no “só depois”, no a posteriori.
Segundo Lacan (ibid.), lançar mão desta doutrina é a única via para conceber que a interpretação possa produzir algo novo. Lacan rompe com um modelo de interpretação que fecha sentido, que dá significações ao analisando. Inclusive, uma palavra apenas pode ter efeito de interpretação – desde que promova alguma retificação subjetiva. Assim, ele diz: “a interpretação analítica está, ela própria, na contramão do sentido comum do termo” (LACAN, 1992 [1969-70], p. 15)
A interpretação tal como Lacan a entende, deve incidir sobre o significante ao qual o sujeito está capturado, subordinado, de modo que possibilite trabalho analítico, promova ruptura entre significantes e, assim, conduza o sujeito a produzir suas próprias significações e a nomear o significante ao qual ele, enquanto sujeito, está assujeitado. Dito de outra forma, a  interpretação provoca corte de modo que outras associações surgem, de modo que o sujeito se retifica subjetivamente frente a sua questão, podendo se implicar sobre o seu sintoma.
A psicanálise só pode operar por meio da palavra do analisando e é sobre essas palavras, tomadas como significantes, que as intervenções do analista, inclusive a interpretação, incidem. Assim, nunca é demais repetir que a intervenção analítica utiliza-se dos próprios significantes que o analisando trás em suas associações e não dos significantes do analista. A interpretação incide sobre a cadeia significante que se desenrola pela fala do analisando, assumindo um caráter enigmático e enviando o sujeito para a causa do desejo. Pensar a interpretação como um "enigma" para o analisando que o põe em trabalho julgo ser uma boa aproximação.
Sendo assim, o que determina se a intervenção realizada pelo analista foi uma interpretação, ou não, são seus efeitos.  Não é possível determinar de antemão que se trata de uma interpretação, mas somente se conseguir produzir alguma espécie de modificação ou vacilação na relação do sujeito com os significantes aos quais ele se encontra subordinado. Nesse sentido, Lacan é bem claro:

Ela [a interpretação] só é verdadeira por suas conseqüências, tal como oráculo. A interpretação não é submetida à prova de uma verdade que se decida por sim ou não, mas desencadeia a verdade como tal. Só é verdadeira na medida em que é verdadeiramente seguida.” (2009 [1971], p. 13)

REFERÊNCIAS:

LACAN, Jacques. A direção do tratamento e os princípios de seu poder (1958). In: Escritos, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998 a.

______________. Seminário 17 – O avesso da psicanálise (1969-70). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992.

LACAN, Jacques.  Seminário 18 – De um discurso que não fosse do semblante (1971). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2009.

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