O
analista trabalha essencialmente com a fala do paciente, pois é na fala que o
inconsciente pode emergir. É isto que Lacan quer assinalar com seu famoso
aforismo, que marcou sua releitura da obra freudiana: “O inconsciente é
estruturado como uma linguagem”. O
inconsciente não está dentro, nem fora, mas se encontra na própria fala do
analisando, cabendo ao analista intervir para que o inconsciente exista. É o
analista que enfatiza aquilo que o sujeito desconsidera. (atos falhos, chistes,
sonhos) Daí, a tese de Lacan: O inconsciente não é sem o analista. A articulação do inconsciente com a
linguagem, toma como referência, como ele próprio nos escreve no Seminário 11: “com um campo que hoje nos
é muito mais acessível do que no tempo de Freud.” (1998 b, p. 25), ou seja,
com campo lingüístico. Esse campo é explorado,
estruturado e elaborado por Claude Lévi-Strauss. Lacan afirma que é por meio da
lingüística, enquanto ciência humana, mas distinta de uma psicossociologia, que
podemos encontrar a estrutura que dá estatuto ao inconsciente. Marco Jorge
(2000), citando Lacan, escreve que “o inconsciente é o que dizemos” e conclui:
“O inconsciente
não se encontra num suposto mais-além da linguagem, nem em qualquer profundeza
abissal ou oculta; ele se acha nas palavras, apenas nas palavras e é nas
palavras enunciadas pelo sujeito que ele deve ser escutado. Estruturado como
uma linguagem, é nela que o inconsciente se acha profundamente enraizado.” (p.
80)
Nos atos falhos, lapsos, sonhos, sintomas,
... enfim, nas manifestações inconscientes, Lacan reconhece um mesmo elemento
comum: sua estrutura como uma linguagem. E assim, afirma que o que Freud
descobriu foi a presença de linguagem no inconsciente. O que Lacan sustenta como
fundamental na obra freudiana é a consideração das relações do homem com a
ordem simbólica. A sobredeterminação inconsciente, descrita por Freud, põe em
evidência a primazia do simbólico na constituição do sujeito.
Dizer que o inconsciente é estruturado
como uma linguagem é afirmar que ocorrem os mesmos tipos de relação entre os
elementos inconscientes e os elementos de qualquer linguagem. É propor que o
modo de funcionamento das representações no inconsciente, para usarmos os
termos freudianos, obedece ao modelo da gramática, enquanto um conjunto de
regras que orientam a transformação (metáfora) e o deslizamento (metonímia)
dentro da própria linguagem. Nisto,
reconhecemos o modo operante, já assinalado por Freud, característico do
inconsciente, no qual as representações se relacionam por meio de condensações
e deslocamentos.
Através da análise, foi possível situar o
inconsciente como um saber, um saber falado. As manifestações do inconsciente
revelam que há um saber que não se sabe, um saber baseado no significante,
sendo justamente por meio delas que esse saber emerge denunciando a verdade do
sujeito - uma verdade que escapa ao ser falante.
O
inconsciente como um saber estar no lugar de preencher a falta de um saber
instintual. É porque nos falta o instinto que a nossa ação é vinculada não a um
saber próprio da espécie humana, mas um saber articulado com significantes que
nos atravessam, significantes que provém do discurso do Outro. O sujeito é marcado por significantes antes
mesmos que estes possam ganhar significações para ele. Isso porque o sujeito
nasce inserido em um mundo de linguagem, de palavras, de significantes e muito
antes dele nascer já lhe é dado um lugar no discurso dos pais. Discurso que não
determina completamente, mas deixa seu registro no sujeito e constitui o Outro
como linguagem ao qual o sujeito se encontra alienado.
REFERÊNCIAS:
- LACAN, J. Seminário 11: Os
quatro conceitos fundamentais da psicanálise (1964).
2. ed. rev Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998 .
- JORGE, Marco. Fundamentos da psicanálise de Freud a Lacan.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000, v.1.