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terça-feira, 18 de novembro de 2014

NOVA PUBLICAÇÃO - Analytica: Revista de Psicanálise

Acabo de receber a notícia que mais um dos meus artigos foi publicado e desta vez na Analytica - Revista de Psicanálise. O título é 
'Perspectiva sobre o Escrito lacaniano "A significação do falo"'. Trata-se de um texto que tem como desafio abordar o conceito de falo a partir de um texto lacaniano fundamental - como o próprio título sugere. O conceito de falo é altamente usado na psicanálise, mas nem por isso deixa de ser tão complexo. Complexidade, esta, que ao longo do texto procuro explorar, situando qual seu lugar e sua importância na constituição da sexualidade. 





RESUMO:
As considerações apresentadas nesta discussão visam situar o ponto fundamental ao qual o falo foi elevado no ensino de Lacan, ou seja: o estatuto de significante estruturador do campo sexual. Para tanto, resgastamos o lugar do falo no mundo antigo, articulando a fonte deste conceito na obra de Freud à história das civilizações e, de modo especial, revisitamos o Escrito “A significação do falo”,  tomando-o como o fio condutor desta reflexão. Consideramos que este artigo, apesar não encerrar a temática sobre esse conceito na obra de Lacan, aborda pontos essenciais sobre a dimensão do falo como significante – articulação presente ao final de seu ensino, mesmo que redimensionado pelo seu avanço teórico no que concerne à sexualidade.


Palavras-chaves: falo; significante; sexualidade; desejo. 

O ARTIGO COMPLETO ENCONTRA-SE ONLINE E PODE SER ENCONTRADO NO LINK ABAIXO: 
http://www.seer.ufsj.edu.br/index.php/analytica/article/viewFile/444/612

domingo, 26 de outubro de 2014

Texto: Reflexões psicanalíticas sobre o “Transtorno de Pânico”

Reflexões psicanalíticas sobre o “Transtorno de Pânico” 
                      

 Por Flavia Bonfim 


            Atualmente, temos observado a descrição pela psiquiatria de novos diagnósticos, como por exemplo, o Transtorno de pânico, dando-nos a impressão que existiriam sintomas propriamente contemporâneos. Essas novidades sintomatológicas nos impõem uma questão, como assinala Nicéas, em seu artigo “Pânico e Angústia”: “Mudaram os sintomas?” E ele próprio responde: “Afirmar que hoje em dia já não existem pacientes como aqueles que procuravam Freud para um tratamento analítico não implica, logicamente, que se leia na queixa de todo paciente atual uma nova formação de sintomas inéditos para a psicanálise.” (2000, p.91)
            Nicéas continua e afirma que não existe equivalência entre queixa e sintoma. As novas queixas são expressões contemporâneas do mal-estar na civilização, contudo, o efeito dessa mudança não possibilita o surgimento daquilo que a psicanálise chama de sintoma, visto que este diz de uma estrutura clínica. Afirmar tal proposição é reconhecer que o sintoma faz parte do laço social e traz as marcas de seu tempo, podendo se “rejuvenescer” e tomar as formas de sua época. De outro modo, podemos dizer que são maneiras novas de os antigos sintomas aparecerem - uma nova roupagem.
            Desse modo, podemos afirmar que o Transtorno de pânico também não é um sintoma inédito para a psicanálise. Muito pelo contrário, ele já havia sido descrito por Freud desde 1895, porém com uma outra nomenclatura, a saber, Neurose de Angústia.
Assim,  partindo das formulação freudianas sobre a angústia e chegando as contribuições de Lacan sobre o assunto, proponho refletir através da psicanalise sobre o que tem sido chamado de Transtorno de Pânico, bem como assinalar a visão psiquiátrica sobre esse transtorno e os motivos que levaram a mesma a propor a invenção desse novo diagnóstico.

Teorias freudianas sobre a angústia


            Nicéas (2000) apresenta o percurso freudiano sobre a angústia a fim de tentar articulá-lo sobre o que hoje em dia tem sido chamado de Transtorno de Pânico. Ele assinala que a interrogação sobre a angústia é precoce em Freud. Em 1994, Freud relacionou angústia e sexualidade. Nessa época, ele também  pensava sobre a neurastenia, afirmando que, assim como a neurose de angústia, ambas tinham origem em uma insatisfação proveniente de uma excitação sexual somática excessiva sem nenhuma representação psíquica. Entretanto, em 1895, Freud separou a neurose de angústia da neurastenia e procurou delimitar essa diferença em termos fenomenológicos.
            Assim, Rabacov (2005), em seu artigo a “Psicanálise e o transtorno de pânico”, descreve o quadro clínico da Neurose de angústia, tal como Freud propõe, por meio dos seguintes sintomas:
§  Irritabilidade Geral
§  Expectativa angustiada – núcleo da neurose e aspecto que a distingue da neurastenia.
§  Ataque de angústia – pode apresentar sozinha ou misturada à fantasias de morte ou de enlouquecimento.
§  Parestesias e alterações de várias funções corporais como respiração, atividade cardíaca e inervação vasomotora.

Nesse período, Freud pensava que o acesso de angústia era uma descarga de excitação sexual física acumulada não satisfeita pela via genital que não podia ser elaborada,  entretanto, com o tempo percebeu que obter satisfação sexual não era suficiente para curar o quadro de angústia e que os sintomas de angústia derivam do mesmo modo que as psiconeuroses de defesa, ou seja, de uma fantasia. Em 1909, Freud retoma novamente a discussão sobre a angústia com o caso Hans.
Freud postulava que Hans apresentava um quadro de histeria de angústia. Esta tinha semelhança estrutural com a histeria, contudo, o afeto, ao invés de ir para o corpo provocando uma conversão, ficava livre, podendo se ligar a um objeto fóbico. Freud dizia que a histeria de angústia se desenvolvia mais no sentido da fobia. Esta era compreendida como uma forma de canalizar a angústia e um trabalho psíquico para ligar a angústia que se tornou livre.
A partir do caso Hans, Freud formula sua primeira teoria da angústia, no qual a articulou com o complexo de castração.  Freud propunha que o medo de cavalo de Hans tenha sido causado por uma superexcitação sexual devida à ternura de sua mãe e que o cavalo representava seu pai e medo do animal se relaciona com a ameaça de punição sofrida pelos maus desejos que ele nutria contra o pai. Para Freud, a ansiedade correspondia a um forte anseio reprimido e como toda ansiedade não tinha um objeto. Mas foi durante um passeio que o medo de que o cavalo o mordesse surgiu. Assim, a ansiedade encontrou um objeto.
Observando as proposições freudiana sobre o caso, Nicéas escreve: “De uma aproximação do objeto fóbico com o pai da criança, Freud extrai o essencial de sua análise da fobia: a permanência do recalque do objeto verdadeiro da angústia, a castração pelo pai, que a resposta fóbica havia canalizado para um objeto de substituição, o cavalo.” (2000, p.100)  Nesse ponto, Freud passa a afirmar, então, que o recalque é o gerador da angústia. E aí está sua primeira teoria da angústia.
Mais tarde, Freud torna a refletir sobre essa temática e, em 1926, no artigo “Inibição, sintoma e angústia”, ele assinala que angústia é um sinal de alarme dado pelo eu e que provoca a fuga pelo sintoma. O perigo é propriamente a ameaça de castração. Esse artigo passa a ser o marco de sua virada na teoria sobre a angústia. Nele, ele pontua que o afeto da angústia não tem origem no recalque, mas no próprio recalacante. A angústia deriva-se da castração e é ela que produz o recalque e não o contrário.

A visão psiquiátrica do Transtorno de Pânico


            Mauro Rabacov (2005) afirma que, segundo Kaplan, Freud foi o primeiro a reconhecer e introduzir o conceito de Neurose de angústia, constituindo uma mescla de sintomas agudos e crônicos. Sendo que o quadro agudo apresenta uma grande similaridade com o Transtorno de pânico, tal como aparece nos manuais de psiquiatria.
            Em 1980, o DSM III abandonou o diagnóstico da neurose de angústia e adotou o de Transtorno de pânico. Até esse momento, segundo Nicéas (2000), havia uma “conversa” entre psiquiatras e psicanalistas, pois a psiquiatria apoiava-se em Freud para falar do quadro clínico de angústia, apesar do tratamento oferecido ser bem distinto. Com essa mudança de nomenclatura, a psiquiatria fez um recorte de fatos clínicos e propôs uma reformulação dos quadros de ansiedade.
            De acordo com o DSM IV,  o diagnóstico do Transtorno de Pânico é dado quando há um ataque de pânico seguido de um mês de preocupação com a possibilidade de ter um novo ataque. O ataque de pânico caracteriza-se por um período de intenso temor ou desconforto no qual 4 dos seguintes sintomas desenvolvem-se abruptamente e alcançam pico em 10 minutos. Eis os possíveis sintomas:


§  Taquicardia                                                             
§  Sudorese
§  Tremores
§  Sensação de falta de ar
§  Desconforto
§  Dor
§  Náusea
§  Tontura, vertigem
§  Desrealização ou despersonalização 
§   Medo de morrer  e/ou de enlouquecer
§  Parestesias
§  Calafrios



Para a psiquiatria, os sintomas do transtorno de pânico estão ligados a um grupo de alterações na estrutura e função cerebral, envolvendo o sistema nervoso e periférico. Nessas alterações, situam os neurotransmissores envolvidos: a noradrenalina e serotonina. Além disso, acreditam que há fatores genéticos envolvidos.
Nicéas (2000) aponta, baseando-se em Mário Costa Pereira,  que a invenção desse novo diagnóstico psiquiátrico se deu em função de um observação clínico experimental, que tomou como referência os trabalhos realizados pelo psiquiatra americano Donald Kein. Este realizou uma pesquisa com o medicamento imipramina, utilizando-o em pacientes com ansiedade crônica e aguda, que constituiam dois grupos, respectivamente. Nesse experimento, ele observou que a imipramina era eficaz no tratamento de pacientes acometidos com crises de angústia agudas, repentinas e inexplicáveis, não obtendo o mesmo resultado com o outro grupo. Por outro lado, com tranqüilizantes habituais, a resposta não era positiva nos grupos com crises agudas.
Costa Pereira observa que a “dissociação farmacológica” possibilitou a criação de uma entidade nosológica que corresponderia a esses novos dados empíricos, que demostra a tendência da psiquiatria a fazer recortes clínicos. Ou seja, de uma dissociação farmacológica no tratamento da angústia, cria-se, então, duas entidades nosológicas: o Transtorno de pânico e o Transtorno de Ansiedade generalizada.

Considerações lacaniana sobre a angústia

            Para Lacan (1962-63), a angústia é estrutural, logo, relaciona-se com a constituição do sujeito. Desse modo, para falar da angústia no sujeito, Rabacov (2005) parte do que está em jogo nessa constituição.
            O sujeito surge imerso no campo do Outro e é efeito de duas operações: alienação e separação. Na alienação, partimos da união de dois conjuntos: o do ser e o do Outro (sentido). O sujeito emerge, então, a partir de uma escolha forçada entre o ser e o sentido, no qual é necessário optar pelo sentido, pois este remete ao Outro da linguagem que constitui o sujeito. Por sua vez, ao escolher o sentido, há uma perda do ser, já que o sujeito advém de outro lugar que não de si mesmo. É em função disso que podemos dizer que o sujeito surge em sua falta-a-ser como efeito do significante. (LACAN, 1964)
            Na separação, há a interseção entre os conjuntos do ser e o do Outro. Na interseção, contudo, não existe nada; é um lugar vazio, onde o sujeito terá sido objeto do desejo do Outro. Aqui, se dá o recobrimento de duas faltas: a do sujeito e a do Outro. O encontro com a falta do Outro, com o desejo do Outro, abre a possibilidade ao sujeito de se identificar com esta falta e ocupar, inicialmente, o lugar do objeto que falta ao Outro, pois esta é a maneira como o sujeito tenta se situar diante do desejo enigmático do Outro. (LACAN, 1964)
            Entretanto, o sujeito constata nessa relação um desencontro - o Outro deseja além dele; o sujeito não consegue tamponar o desejo do Outro. Isso permite ao sujeito sair do lugar de objeto e escolher por se tornar desejante. As conseqüências dessa operação é um resto, que é o objeto a  - causa do desejo. (LACAN, 1964)

            É na tensão entre o sujeito e o objeto a que podemos situar a angústia. Esta é testemunha do objeto real que está em causa no sujeito. Rabacov (2005) a descreve como um sinal de perigo vindo de um lugar onde o sujeito desconhece, inarticulável, ponto de inflexão da cadeia significante. A angústia é o índice da presença do objeto a. Isso porque desvela a falta, a incompletude, o furo, o desejo enigmático do Outro, a ausência da relação sexual. No centro da angústia está a dimensão da falta. Falta, esta, impossível de ser tamponada por nenhum objeto.
Assim, podemos dizer que a angústia é estrutural; ela provém daquilo que está para todo sujeito – o objeto causa do desejo e a dimensão da falta. Contudo, ela pode estar mais intensa no sujeito tal como nos denuncia no ataque de pânico quando o encontro com o real, com o furo, é excessivo.    

BIBLIOGRAFIA:

  • LACAN, Jacques. Seminário 10 – A angústia (1962-63). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005.

  • ______ Seminário 11 – Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise (1964). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.

  • NICEAS, C. A. Pânico e angústia. In:  Latusa – Rio de Janeiro: Revista da Escola Brasileira de Psicanálise,  no 4/5,2000.

  • RABACOV, M. “A psicanálise e o transtorno de pânico”. In: O objeto da angústia. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2005.




terça-feira, 21 de outubro de 2014

INSCRIÇÃO PARA OS CURSOS DO INSTITUTO DE CLÍNICA PSICANALÍTICA DO RIO DE JANEIRO (ICP-RJ)





COMUNICADO DE ABERTURA DAS INSCRIÇÃO PARA OS CURSOS DO INSTITUTO DE CLÍNICA PSICANALÍTICA DO RIO DE JANEIRO (ICP-RJ) EM 2015

O Instituto de Clínica Psicanalítica do Rio de Janeiro tem o prazer de comunicar que em 2015 abrirá novas turmas dos Cursos do ICP-RJ, cuja implementação tem como objetivo propiciar o acesso aos conceitos que ordenam a experiência analítica, a partir de uma leitura que se situa no eixo de Lacan a Freud, no contexto da orientação lacaniana estabelecida por J. A Miller.
As inscrições para o processo de seleção devem ser realizadas na secretária do ICP-RJ, com a secretária Rosane, devendo o candidato, nessa ocasião, anexar uma carta de apresentação e seu Curriculum Vitae.
O inscrito na seleção será entrevistado por dois membros do Conselho do ICP-RJ.
O período de inscrição é de 20 de outubro  a 5 de novembro de 2014.
O resultado do processo será comunicado até o dia 15 de dezembro de 2014.

Informações:
Endereço Rua Capistrano de Abreu 14 Humaitá. Telefone 22867993. icprio@icprio.com.br

domingo, 19 de outubro de 2014

Lançamento da Revista Latusa 19 - uma publicação da Escola Brasileira de Psicanálise (EBP-RIO)





Aconteceu no dia 17 de outrubro de 2014, nas Jornadas Clínicas da EBP-RIO e ICP-RJ, o lançamento da Revista Latusa 19, cujo artigos se articulam em torno do tema "SAMCDA - O que se opõe ao discurso analítico". Um tema que me colocou em trabalho e me pôs a escrever sobre o minha prática na Associação Fluminense de Reabilitação. Assim, compartilho com vocês a notícia da publicação de mais um artigo, cujo título é

"Intocáveis: sobre a marca da deficiência e a psicanálise no campo da reabilitação"
















domingo, 5 de outubro de 2014

Programa das XXIII Jornadas Clínicas da Escola Brasileira de Psicanálise - EBP/RIO

Programa das XXIII Jornadas Clínicas da Escola Brasileira de Psicanálise
O TRAUMA E SUAS VICISSITUDES

Credenciamento
O credenciamento terá início no dia 10 de outubro, na secretaria da EBP-Rio. Estará disponível o material para a Conversação dos Núcleos.
Sexta feira, 17 de outubro de 2014
8h00 às 8h45 – Credenciamento (para aqueles que não o fizeram antes)
8h45 às 12h00 – Conversação de Núcleos do ICP: trauma, inconsciente e sintoma
Para participar da Conversação, é fundamental a leitura prévia dos casos, disponíveis na Secretaria da EBP-Rio a partir de 10 de outubro.
  O tratamento da psicose – um furo no Outro
  Autor: Francisca Menta – Núcleo: Psicose e Saúde Mental
  Leitor: Cristina Duba – Núcleo: Psicanálise e Direito
  Um corpo como parceiro
  Autor: Maria Lídia Arraes Alencar – Núcleo: Topologia
  Leitor: Fernando Coutinho – Núcleo: Psicanálise e Medicina
  Trauma e luto
  Autor: Maria Inês Lamy – Núcleo: A criança no discurso analítico – Curumim
  Leitor: Ana Lucia Lutterbach Holck – Unidade de Pesquisa: Práticas da letra
  “Hoje tô com sangue nas vistas”: um caso de toxicomania e psicose ordinária
  Autor: Selma Pau Brasil – Núcleo: Toxicomanias e Alcoolismo
  Leitor: Ondina Machado – Núcleo: Clinica e Política do ato
  Comentadora: Marie-Hélène Brousse
  Coordenadora: Maria do Rosário Collier do Rêgo Barros
13h30 às 14h00 – Abertura
Maria Silvia G. F. Hanna
14h00 às 14h15 – Palavras da Diretora do Conselho da EBP-Rio
Ângela Folly Negreiros
14h15 às 16h00 – Plenária 1
Trauma: o conceito
 Heloisa Caldas
 Maria do Rosário Collier do Rêgo Barros
 Comentários: Marie-Hélène Brousse
 Coordenação: Mirta Zbrun
16h00 às 16h45 – Intervalo
16h45às 18h45 – Plenária 2
Trauma: a perda seca
Marcus André Vieira
Ram Mandil
Comentários: Marie-Hélène Brousse
Coordenação: Stella Jimenez
18h45 às 20h00 – Lançamentos de livros e conquetel
Sábado, 18 de outubro de 2014
8h00 às 12h30 – “Manhã Clínica: conversas paralelas”
Serão quatro salas de trabalho em que cada um dos quatro eixos temáticos promoverá uma manhã de discussão clínica. Em cada sala, haverá três mesas de debate a partir dos trabalhos enviados e uma mesa final em que se retomará o trabalho desenvolvido durante toda a manhã. É interessante o participante das XXIII Jornadas escolher um eixo temático para acompanhar o avançar dos trabalhos da manhã clínica. (A programação detalhada da ‘Manhã Clínica’ estará disponível na pasta das Jornadas, entregue no credenciamento.)
    Eixo 1 – Trauma e Corpo
    Coordenação: Márcia Zucchi
    Eixo 2 – Trauma e Desejo do Analista
    Coordenação: Andréa Reis Santos
    Eixo 3 – Trauma e Laço Social
    Coordenação: Rodrigo Lyra
    Eixo 4 – Trauma e Linguagem
    Coordenação: Heloisa Caldas
12h30 às 14h00 – Almoço
14h00 às 16h00 – Mesa Redonda
Entre o sujeito e o Outro, o testemunho do Trauma
Ana Lucia Lutterbach Holck, Lucíola de Macêdo,
Manoel Motta e Romildo do Rêgo Barros
Comentários: Marie-Hélène Brousse
Coordenação: Ondina Machado
16h00 às 16h45 – Intervalo
16h45 às 18h15 – Plenária final
Marie-Hélène Brousse
Comentários: Romildo do Rêgo Barros
Coordenação: Elisa Monteiro
18h15 às 18h30 – Encerramento
Ana Tereza Groisman e Maricia Ciscato

Mais informações no blog:
http://otraumaesuasvicissitudes.wordpress.com/2014/10/05/programa-das-xxiii-jornadas/

domingo, 31 de agosto de 2014

Texto: "O trauma, generalizado e singular". Por Éric Laurent


O trauma, generalizado e singular*



Por Éric Laurent 

Desde o início de seu ensino, Lacan tomou distância de uma concepção do trauma como simples experiência do acidente. «Pois, afirmar da psicanálise e da história que, como ciências, elas são ciências do particular não quer dizer que os fatos com que elas lidam sejam puramente acidentais, senão factícios, e que seu valor último se reduza ao aspecto bruto do trauma.» 1. Assim, o trauma não pode ser tomado sem a estrutura.

     Esse ponto pode ser especialmente verificado nos traumatismos de massa. Com efeito, mesmo as contingencias sofridas por um grande número de pessoas ressoa de modo único para cada um. Esse é o ponto crucial da abordagem psicanalítica do tratamento dos traumas de massa2, como aqueles que foram experimentados pelos habitantes de Nova Iorque em 2001 e os de Madri em 2004: visar o singular do sujeito.

Duas cidades traumatizadas

     Esse tratamento dos traumas de massa, vividos em grupo, apresenta múltiplas fases. Num primeiro tempo, trata-se de articular o grupo e o indivíduo: «por um tempo, é determinante manter o que constituiu na situação concreta, o grupo, para poder desamarrá-lo e não desfazê-lo» 3.
     Podemos também observar esse aspecto no que nossa colega Maria Cristina Aguirre nos conta a respeito de seu trabalho, depois de 11 de setembro de 2001, em Nova Iorque4. Enquanto voluntária no trabalho de ajuda psicológica aos traumatizados, ela foi designada para o Kid’s Corner, que acolhia as crianças que apresentavam sintomas relacionados aos atentados terroristas. Ela evoca o caso de uma menininha de três-quatro anos «cujo nível de angústia era tal que ela era como que tendo um empuxo a correr por todos os lados, deixando os policiais e os agentes do FBI loucos, enquanto os pais não conseguiam preencher os formulários necessários para dar queixa…» Ela testemunha : «Eu me dediquei a trabalhar com ela. Eu a acompanhei nessa fuga insensata; ganhei sua confiança e, pouco a pouco, obtive certa estabilização. O momento chave foi a instalação de uma espécie de fort-da simbólico: ela ia até seu pai e sua mãe, que ela tocava, e depois voltava para onde eu estava. No final do dia, ela pode desenhar e estabelecer contato com as outras crianças.»5
     Num primeiro tempo, as reações ao traumatismo são também grupais, segundo estilos «simbólicos» ou «de pânico» diversos. Na Espanha, as manifestações das multidões compactas ocupando praças e avenidas, em Madri como no resto do país, fazem parte da cultura, aquela da rua, das manifestações, do paseo. O luto espanhol é maciço e exteriorizado. Em Nova Iorque, a reação foi muito diferente. O processo de individuação passou imediatamente para o primeiro plano. Processos de «des-massificação» responderam aos mortos indistintos. Estabeleceu-se a lista precisa dos nomes, testemunhos dos parentes, dos amigos, ligados às velas colocadas ao longo das paliçadas de Ground Zero ou sobre as grades da igreja de Saint-Paul, que fica ali perto. O luto de massa se apresentava nas telas da televisão, pois a rua americana é a televisão. Para além da diferença de estilo simbólico, houve uma manifestação «de pânico». Manifestação de uma emoção, de um afeto, numa reação difícil de decifrar. O acontecimento e seu alcance excedem os comentários que tentam dar conta deles. Os comentaristas políticos e as «classes falantes» em geral tentaram reduzir o sem sentido produzido por esse acontecimento, mas o fato resiste, verdadeiro buraco no discurso.
     O horror é «traumatismo», no sentido clínico, na medida em que temos que lidar com mortes, feridas que deixaram sequelas físicas e psíquicas, mas também na medida em que ele cria um buraco no discurso comum. Quer seja no nível coletivo ou no nível singular, encontramos a impotência do discurso em ler o acontecimento. É essa impotência comum que o post-traumatic stress disorder, do DSM V tenta reduzir a um fundamento biológico, universal, transcultural.


A generalização do trauma

     A clínica clássica do trauma foi estendida, no DSM, durante o último quarto do século 20. Essa extensão decorre de um fenômeno situado na interface entre a descrição científica do mundo e aquilo que a excede.
     Na medida em que a ciência avança na descrição de cada uma de nossas determinações, desde a programação genética até a programação do meio ambiente global, passando pelo cálculo dos riscos possíveis, ela faz existir uma causalidade determinista universal. O mundo, mais que como um relógio, surge como um programa de computador. É nosso modo atual de ler o livro de Deus. Então surge o escândalo do contingente, do impossível de programar, do trauma. É na medida em que nos beneficiamos de uma melhor descrição científica do mundo que toma consistência a irrupção de uma causa não programável. Tudo o que não é programável se torna trauma. Ao ponto que alguns querem considerar a própria sexualidade como um post-traumatic stress disorder. Nosso corpo não é feito para ser sexuado, como mostra o fato de que homens e mulheres se comportam pior do que os animais.
     As tentativas de dissolução do sexual num trauma nos lembram que a psicanálise freudiana foi fundada precisamente sobre o abandono da teoria do trauma da sedução. Entre 1895 e 1897, Freud pensou, com efeito, poder reduzir a sexualidade a um mau encontro. Em seguida ele abandonou essa teoria e pensou que é na sexualidade como tal que era preciso encontrar a causa necessária do mal estar.
     Só vinte e cinco anos mais tarde, depois da primeira guerra mundial, é que Freud deu um sentido novo aos acidentes traumáticos e às suas consequências patológicas. Ele fez deles, então, um exemplo do fracasso do princípio do prazer e um dos fundamentos da hipótese da pulsão de morte. Freud deve ter conhecido a síndrome traumática de guerra, pois ele foi consultado como expert durante a guerra e logo depois. Jean-Claude Maleval6 lembra quanto Freud tomou partido contra os métodos utilizados pela psiquiatria alemã da época para tratar os traumatizados7.
     A segunda guerra mundial continuou a tendência liberal do tratamento das neuroses de guerra. Nós aprendemos, nessa extensão, que contrariamente ao que Freud pensava em 1918, o fato de ter sido ferido fisicamente não protege de uma neurose traumática. Oitenta por cento dos feridos graves apresentavam, e isso até muitos anos depois do acontecimento, síndromes de repetição, distúrbios fóbicos ou depressivos. Foi sobretudo o pós-guerra do Vietnam que mudou a concepção do tratamento do trauma em psiquiatria8. Não foi senão em 1979 que os veteranos foram recenciados, avaliados, inseridos em programas de reabilitação e que a sociedade americana se reconciliou com seus soldados traumatizados. Os psiquiatras americanos, altamente mobilizados em torno desse problema, revalorizaram o conceito de stress e a particularidade da reação que ele engendra. Foi a importância da mobilização dos psiquiatras e psicólogos americanos sobre o tema social da reinserção que fez o trauma sair do círculo estreito da psiquiatria militar para se tornar uma perspectiva geral da aproximação de fenômenos clínicos ligados às catástrofes individuais ou coletivas da vida social.
     O segundo fator que leva à extensão da síndrome é a patologia própria às megalópoles da segunda metade do século 20. Estas agem num duplo registro. Por um lado, elas engendram um espaço social marcado por um efeito de irrealidade. O admirável pensador Walter Benjamin9 chamava esse efeito de «o mundo da alegoria», próprio à cidade grande, onde o reino da mercadoria, da publicidade, do signo, mergulha o sujeito num mundo artificial, numa metáfora da vida. Mídia e televisão generalizaram esse sentimento de irrealidade, de virtualidade. Por outro lado, a aldeia global, lugar do artefato, é também o lugar da agressão, sobretudo sexual, da violência urbana, do terrorismo, etc.
     Foi nos Estados Unidos, inicialmente, que os grupos feministas quiseram fazer reconhecer o estupro como um trauma, não mais como um delito de direito comum, mas um crime.
     Certas categorias profissionais também demandaram reparação pelo stressque elas sofriam. Por uma espécie de careta da história, o sindicato dos condutores de trens alemães pediu reparação pelo stress produzido pelo fato de que a Alemanha é o país da Europa onde se suicida mais pulando sob os trens (um suicídio a cada cinco minutos).
     Dois fatores participam, portanto, da extensão da clínica do trauma. Por um lado, a experiência psiquiátrica dos traumas de guerra nos países democráticos, quer dizer, nos países no qual não se abandona seus cidadãos à morte sem palavras. Por outro lado, levar em conta a patologia civil do trauma estende a definição da experiência traumatizante àquela que comporta o encontro com um risco importante para a segurança ou para a saúde do sujeito. A lista dos perigos mistura catástrofe técnica, acidente individual ou coletivo, agressão individual ou atentado, guerra ou estupro.


A energia do trauma

     Desde 1895, Freud liga o núcleo da neurose e a síndrome de repetição. Ele menciona, em sua descrição da histeria de angústia, o despertar noturno seguido de uma síndrome de repetição com pesadelos. É só depois do isolamento do puro instinto de morte que ele separará os sonhos de repetição e a histeria, e falará, na síndrome de repetição traumática, de um fracasso da repetição neurótica, das defesas, do escudo para-excitação.
     Em 1926, quando modifica o sentido do «trauma do nascimento» de Otto Rank, Freud traz as concepções energéticas que ele havia anteriormente correlacionado com momentos de angústia diante das perdas essenciais. Freud distingue a angústia sentida no nascimento e que deriva, propriamente falando, do traumatismo da perda do objeto materno. Ele ousa fazer da perda necessária da mãe o modelo de todos os outros traumas10. É sobre esse fundo que é preciso escutar o aforisma que figura no texto sobre «A denegação» de 1925, quase contemporâneo do precedente, onde o objeto não deve ser encontrado, mas sempre «reencontrado»11, isto é, encontrado sobre o fundo de uma perda primordial.
     Lacan sublinhou que é no movimento mesmo em que comunicamos nossas experiências de perda, que fazemos a descoberta dos limites dessa comunicação, a saber, que a linguagem é um muro do qual nós nunca saímos. Na borda da estrutura de linguagem, um certo número de fenômenos clínicos decorrem da categoria do real. Esses fenômenos estão ao mesmo tempo na borda e no centro desse sistema da linguagem. O trauma decorre, portanto, de uma topologia que não opõe simplesmente o interior e o exterior. O trauma, a alucinação, a experiência de gozo, a angústia, são fenômenos que tocam no real e nos arrancam de nossa tendência a considerar a vida como um sonho, para continuar a dormir.


Os lugares do trauma

     Como abordar, mais precisamente, a topologia do trauma ? Lacan, desde 1953, propõe, para dar conta disso, inscrever a linguagem não sobre uma superfície, mas sobre um toro, «na medida em que sua exterioridade periférica e sua exterioridade central constituem apenas uma única região»12.

     Esse modelo apresenta a particularidade de designar um interior que está também no exterior13. Em primeiro lugar, portanto, o trauma é um buraco no interior do simbólico. O simbólico está aqui colocado como o sistema dasVorstellungens através das quais o sujeito quer encontrar a presença de um real. O simbólico inclui aí tanto o sintoma em seu envoltório formal quanto aquilo que não chega a fazer sintoma, ou seja, esse ponto de real que permanece exterior a uma representação simbólica, quer ela seja sintoma ou fantasia  inconsciente. Ele permite figurar o real em «exclusão interna ao simbólico». «Assim, o sintoma pode aparecer como um enunciado repetitivo sobre o real […] O sujeito não pode responder ao real a não ser fazendo dele sintoma. O sintoma é a resposta do sujeito ao traumático do real.»14 Esse ponto de real, impossível de se absorver no simbólico, é a angústia entendida num sentido generalizado, que inclui a angústia traumática.
     A posição do psicanalista que se deduz desse modelo é dupla. A princípio, ele é aquele que vai dar novamente sentido àquilo que não o tinha na história do sujeito. No acidente mais contingente, a restituição da trama do sentido, da inscrição do trauma na particularidade inconsciente do sujeito, fantasia e sintoma, é curativa. Essa possibilidade de apagamento do trauma é aquela à qual Lacan faz referência em «Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise» quando ele escreve que «o primeiro acontecimento retornará a seu valor traumático, suscetível de um progressivo e autêntico apagamento, se não reavivarmos expressamente seu sentido» 15.
     Em seguida, o psicanalista é aquele que «empuxa» a falar. Nós encontramos aí uma função do traumatismo enquanto que ele tem como consequência surpreendente deslocar os limites do discurso. Fala-se com as pessoas que não se falava e de coisas das quais não se falava. Membros de uma mesma família, que haviam se tornado estranhos um com o outro, reatam. Novos laços se criam. Nesse segundo sentido, o analista é um parceiro que traumatiza o discurso comum para autorizar o discurso do inconsciente. O analista sabe que a linguagem, em seu fundo mais íntimo, é fora de sentido.
     Em seu curso intitulado «Causa e consentimento», Jacques-Alain Miller nota que «o sujeito do significado é um traumatizado pelo significante», isto é, traumatizado por aquilo que Lacan nomeará da a «não-inscrição da relação sexual» $ depois de tê-lo chamado, num texto anterior de «trauma sexual». «Entre o significante enigmático do trauma sexual e o termo que ele vem substituir numa cadeia significante atual passa a centelha que fixa num sintoma[…] a significação, inacessível ao sujeito consciente onde ele pode se resolver.»16
            A originalidade da psicanálise no conjunto das terapias do trauma pela palavra é a de testemunhar da aptidão para a invenção do sintoma, solução que responde ao trauma da língua. A manifestação da loucura ordinária do mundo nos habituou, desde então, a viver com outras formas de um trauma onipresente. Ele não provoca a angústia social generalizada (tag : para distúrbio ansioso generalizado), em linguagem dsm, mas uma angústia «pré-traumática», que nos torna aptos a nos dirigir, um a um, à psicanálise a fim de, para além da angústia, encarar nosso pedaço de real.

Tradução: Cristina Drummond
  Revisão: Pierre-Louis Brisset



1 Lacan J., «Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise», Escritos, RJ, Zahar, 1998, p. 262.
2 Briole G., «Despues del horror, el traumatismo», El Psicoanalisis, n° 7, juillet 2004, p. 57-67.
3 . Ibid., p. 64.
4 . Aguirre M. C., «Septiembre 11, 2001 : Una experiencia», El Psicoanalisis, n° 7, pp. 68-70.
5 Ibid., pp. 68-69.
6 Maleval J.-C., «De l’extension du champ psy et de ses clivages», Cliniques méditerranéennes, n°71, 2005, p. 233-247.
7 . Freud, S., «Traitement électrique des névrosés de guerre», Résultats, idées, problèmes I, 1890-1920, Paris, puf, 1984, p. 251-252.
8 . Briole, G., Lebigot, F., Lafont, B., Favre, J.-D. Vallet, D., Le traumatisme psychique : rencontre et devenir, publié par le Congrès de Psychiatrie et de Neurologie de langue française, Paris, Masson, 1994.
9 . Benjamin W., «Paris capitale du xixe siècle» (1935), Œuvres, Tome iii, Gallimard, 2000, p. 59.
10 Freud S., Inhibition, symptôme et angoisse, Paris, puf, 1973, pp. 99-100.  «A situação na qual ele sente a ausência da mãe, sendo mal compreendida, não é para ele uma situação de perigo, mas uma situação traumática […]. A primeira condição determinando a angústia que for introduzida pelo próprio eu (moi) é, portanto, aquela da percepção da perda do objeto[…]. A situação traumática criada pela ausência da mãe se afasta sobre um ponto decisivo da situação traumática do nascimento. No momento do nascimento, com efeito, não havia objeto cuja ausência se pudesse sentir.»
11 Freud S., «La négation», Résultats, idées, problèmes II, 1921-1938, Paris, puf, 1985.
12 Lacan J., «Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise», Escritos, RJ, Zahar, 1998, p. 322.
13 Luminet J.-P., L’Univers chiffonné, Paris, Fayard, 2001, p. 325. O resultado foi conseguido a partir da definição de uma grandeza chamada «gênero» de uma superfície fechada desde 1813 por Simon Lhuilier. «Pode ser também definido por qualquer superície fechada, e ele é chamado “gênero”. O gênero do toro é 1, o da esfera é 0, o de uma esfera munida de T punhos é T.»
14 Miller J.-A., «Le Séminaire de Barcelone sur Die Wege der Symptombildung»,Le symptôme charlatan, Paris, Seuil, 1998, p. 51.
15 Lacan J., «Função e campo da fala…», op. cit., p. 262.
16 . Lacan J., «A instância da letra no inconsciente ou a razão desde Freud»,Escritos, RJ, Zahar, 1998, p. 522.


* Extraído do site do XX Encontro Brasileiro do Campo Freudiano